05 março, 2006

Esta não proporciona uma estética corporal


JORNADA DA MACONHA

A mobilização mundial não teve a força participativa de outros tempos. Qual seria a razão?

Por Walter Fanganiello Maierovitch

Há cinco anos, e em diferentes cidades espalhadas pelo planeta, são realizadas, no mês de maio, manifestações para chamar a atenção sobre as políticas, internacionais, nacionais ou municipais, a envolver a erva canábica. O objetivo inicial desses encontros mundiais consistia em pressionar as autoridades para a liberação do consumo da maconha para finalidade lúdica, recreativa, de modo a mudar o estabelecido nas convenções das Nações Unidas e nas leis ordinárias nacionais. Neste mês de maio, nos dias 7 e 8, a denominada Jornada Mundial da Cannabis envolveu cerca de 200 cidades, quando se esperavam manifestações em 400. A Jornada, portanto, não teve a força participativa de outros tempos e deu pouca mídia. Por exemplo, em São Paulo, na Câmara Municipal, estavam presentes pouco mais de 50 pessoas. O comitê organizador internacional da Jornada deixou em aberto as pautas, mas insistiu, com acerto, em três pontos básicos: acesso imediato à maconha para finalidade terapêutica, fim da perseguição policial ao usuário da erva e permissão para cultivo em residências. Qual teria sido o motivo do arrefecimento do movimento, nessa sua quinta edição anual? A resposta não é difícil. Muitos países, exceção aos EUA e à França no Primeiro Mundo, evoluíram racionalmente. Por outro lado, os adeptos do alarmismo e da satanização, como os governos brasileiros desde a ditadura militar, ficaram para trás e as suas posições só convencem os fundamentalistas da War on Drugs. Empolgam aqueles que continuam a acreditar ser possível uma sociedade sem drogas e pregam cadeia ao usuário: France sans drogue, do ministro da Justiça, Dominique Perben. Apesar do esforço em contrário do presidente George W. Bush e do seu czar antidrogas John Walthers, o uso terapêutico da maconha é permitido em 11 estados norte-americanos: Alasca, Colorado, Havaí, Maine, Montana, Nevada, Oregon, Vermont, Arizona, Califórnia e Washington. Em 2004, o governo da Holanda autorizou a venda da erva em farmácias, para infusões e sob prescrição médica. O governo do Canadá cultiva e fornece marijuana a pacientes, com princípio ativo baixo. Experimentalmente, neste ano de 2005, dez farmácias e três hospitais de Barcelona, na Espanha, foram autorizados a vender drágeas de maconha, a critério médico. Na embalagem consta a recomendação para a maconha não ser fumada, pois os riscos de câncer de pulmão e garganta são semelhantes aos do cigarro de tabaco. O Parlamento de Berlim, no mês de abril, aprovou lei a permitir a posse e a compra de até dez gramas de maconha. E a Holanda legalizou, desde 28 de novembro de 1968, a venda de até meio quilo de maconha, para consumo interno nos cafés. A meta foi afastar o usuário do traficante. Há um ano, a Inglaterra rebaixou a maconha para a tabela “C”, reservada às chamadas drogas leves. A iniciativa foi da própria associação britânica de policiais, que percebeu a tendência dos agentes de perseguir usuários de marijuana e deixar em paz os traficantes. A Holanda discute o fornecimento governamental de maconha para emprego médico-terapêutico. Enquanto isso, em cada residência, é autorizado o plantio e cultivo de até cinco pés de maconha. O Brasil continua a criminalizar a posse de drogas para uso próprio. E o último presidente da Câmara dos Deputados entendeu, numa visão curta, representar avanço a aprovação de um projeto legislativo, já remetido ao Senado, que não mais impõe pena de prisão, embora continue a criminalizar. Aquele que for condenado por porte de droga para uso próprio e acabar sancionado com a pena de tratamento obrigatório, poderá, ridiculamente, ser processado por crime de desobediência e ir para a cadeia caso abandone a terapia. Como anualmente ocorre, a reação da Casa Branca à Jornada Mundial da Cannabis parte para a demonização. O czar de Bush diz que o uso de maconha não é tão inocente: pode levar à esquizofrenia. Fora isso, Bush e Walthers apostam todas as fichas em uma decisão da Suprema Corte, marcada para o mês de junho, sobre o caso Angel Raich. Angel tem um tumor no cérebro. Segundo relatou, chegou a usar uma centena de medicamentos antes de recorrer à marijuana, utilizada na forma de cigarro. Angel sustenta, com apoio do médico, tratar-se da única terapia a terminar com as terríveis dores de cabeça. Mais ainda: ressaltou que em seu estado a lei admite o uso terapêutico. A polícia federal norte-americana (FBI) invadiu a casa de Angel, realizou a sua prisão em flagrante e apreendeu a maconha encontrada. Para isso, baseou-se na lei federal e não deu a mínima para a estadual. Para Bush, a lei estadual não pode modificar a proibição contida na federal. Daí ter recorrido à Corte Suprema, cujo julgamento, no caso Angel, está marcado para junho.
Carta Capital 18/05/2005

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